Em Troca de Um Coração – #lerjodipicoult

Esta leitura foi inserida no projecto #lerjodipicoult organizado pela Sandra e pela Dora. Visitem os canais delas e juntem-se às leituras mensais que vão sendo anunciadas! Em Novembro vamos ler “Um Clarão de Luz” 💡

Eis a segunda leitura do #lerjodipicoult e também a minha primeira releitura, que posso garantir que não terá sido a última. Acontece que na passagem da minha pré-adolescência para a adolescência efectiva, tive a minha fase romântica em que me fartei de ler Jodi Picoult e Dorothy Koomson (na loucura, até cheguei a pegar em Nora Roberts!).  Como tal, nessa altura acabei por ler a maioria dos títulos publicados pela autora, ainda nas velhinhas edições da extinta Civilização Editora (RIP). É por isso que pressinto que venham por aí muito mais releituras neste projecto.

Shay foi condenado à morte por matar a pequena Elizabeth Nealon e o padrasto. Onze anos mais tarde, a irmã de Elizabeth, Claire, precisa de um transplante de coração e Shay, que vai ser executado, oferece-se como dador. Este último desejo do condenado complica o plano de execução, pois uma injecção letal inutilizaria o órgão. Entretanto, a mãe da criança moribunda debate-se com a questão de pôr de parte o ódio para aceitar o coração do homem que matou a sua filha.

Lembro-me perfeitamente que já na altura em que o li pela primeira vez, não fiquei grande . Primeiro, o núcleo da história não foi totalmente original para mim, uma vez que uns anos antes tinha visto o filme Green Mile , baseado na obra de Stephen King que vim a ler posteriormente. Quem viu o filme, compreenderá os paralelos; aliás, não sou a primeira nem serei a última a estabelecer esta comparação. Para quem não conhece, o filme conta a história de um homem condenado à pena de morte por violar e matar duas crianças que, na prisão, começa a realizar milagres e a levar pessoas a questionar sobre quem será ele na realidade. Portanto, será que a Jodi Picoult tirou um bocado de inspiração dessa obra?

(screenshot da conta oficial da Jodi)

… É bem possível que sim. Mas bom, aparentemente o Stephen leu aquilo e não decidiu avançar com nenhum processo malicioso ou difamatório, por isso diria que estamos bem. Vamos mas é começar a falar do livro em questão.

Em Troca de um Coração” não é, de todo, dos meus livros preferidos da Jodi. Uma reclamação pessoal que tenho de fazer é sobre aquela mania que a Civilização tinha de colocar uma fonte diferente para cada ponto de vista, seja porque a edição original o faz também ou não. É desnecessário e ridículo, um bocado infantil até, mas as edições novas já se deixaram disso e só tenho a agradecer.

Gostei de todos os pontos de vista da história, desde o padre ao condenado da cela do lado de Shay. Acho que foram personagens bem escolhidas para nos contar a história – todos à excepção do detective, que era dispensável. Até acabei por gostar da Maggie, a advogada estereotipada como a mulher gordinha e sozinha que encontra consolo em animais de estimação e potes de gelado. Esta descrição teve tudo para me enervar – e a início revirei muito os olhos – mas no final até me acabei por identificar em alguns aspectos e fiquei contente por a ter na história. Mesmo incluindo o final feliz forçado em que ela acaba a fazer par com o doutor bonzão e inteligente, algo que é muito improvável de acontecer na vida real. É triste, mas é.

O final não é muito surpreendente, pelo contrário, acho que toda a narrativa é conduzida de modo a fazer-nos desconfiar que alguma coisa não está bem desde o início. Independentemente disso, a leitura é muito fluída e é daqueles livros difíceis de fechar quando temos mesmo de ir dormir. Demorei nem três dias a acabar o livro, e provavelmente teria conseguido terminar em menos tempo não tivesse eu mais responsabilidades na vida. 

No entanto, concordo com algumas críticas que já vi serem feitas à carga excessiva de religião neste livro. É claro que é necessário trazer a religião e a ética para uma história como esta, mas não teria sido mais interessante focarmo-nos na temática das prisões perpétuas e penas de morte e desenvolvê-la bem? Chega-se ao ponto de se trazer personagens do livro “Uma Questão de Fé” (e inclusive de dar spoilers dessa história) para repisar assuntos que são bem discutidos nesse outro livro e que não têm tanta necessidade de estar a ocupar espaço no “Em Troca de um Coração”. Acho que é preferível uma narrativa arrancar com uma premissa e ter apenas um foco, em vez de dispersar e viajar por assuntos meio relacionados mas diferentes. Pelo menos eu prefiro assim. 

Clica aqui para ler spoilers!

Esta é a secção só para quem já leu o livro ou para quem não se preocupa com spoilers. Se não são uma dessas pessoas, fujam agora!  Primeiro, podemos concordar todos que a June tem de ser das pessoas mais desgraçadas deste mundo? Vamos lá ver: casa-se com o homem da sua vida e perde-o num acidente, o segundo marido e a filha mais velha são assassinados quando ela está no seu oitavo mês de gravidez, a filha mais nova desenvolve um problema cardíaco crónico, o único coração compatível que encontram pertence ao assassino do marido e da filha, E, mesmo depois de quase sarar todas estas feridas, descobre que afinal o segundo marido abusava sexualmente da filha! Até o cão dela morre no final… mais ou menos.

Gente… eu sei que há pessoas com vidas HORRÍVEIS, não é isso que está em causa. Mas fica muito difícil relacionarmo-nos com a personagem e acho que tira até alguma credibilidade à história. Sei que é subjectivo, este meu problema com personagens que são demasiado “coitadinhas“, mas também sei que não estou sozinha. 

E falando ainda na June… terei sido a única pessoa a achar que ela aceitou a história dos abusos sexuais demasiado “bem”? Não houve debate, contra-argumentação ou tentativa de defesa do marido, como se lá no fundo ela sempre soubesse, o que não faz sentido. Uma mãe como a June que soubesse – que desconfiasse sequer, nunca teria deixado a coisa andar para a frente. Não gostei de como lidaram com essa revelação, foi largar uma bomba porque se sabia que ia chocar os leitores, mas aparentemente nem as personagens se chocaram. Intrigante, no mínimo.

A última coisa que quero comentar é aquela história com a irmã do Shay – sim, aquela moça que só ficamos a conhecer quase no final da história, vem salvar o dia e volta a desaparecer. Porque não nos bastava um só coitadinho na história, precisávamos de um segundo: Shay, o incompreendido. O homem que descobre que a irmã é abusada, pega fogo à casa dos abusadores e acaba num reformatório. O mesmo homem que, anos mais tarde, descobre que o patrão anda a abusar da filha adoptiva, acaba por matá-lo sem querer e acaba no corredor da morte. Coincidências do caraças, não?

Concluindo, “Em Troca de um Coração” não foi um livro que me tenha surpreendido, tanto pela sua falta de originalidade em alguns aspectos da história como por alguns pontos menos credíveis no final do livro que me fizeram revirar os olhos.

Trouxe uma premissa muito interessante mas que acabou por ser subexplorada e até ofuscada pelos floreados que foram divergindo dessa premissa original, alguns demasiado rebuscados para o meu gosto. Está longe de ser um dos meus livros preferidos da Jodi Picoult, mas é de facto um título que não pode faltar na estante de quem se intitula fã da autora.

Título Original: Change of Heart
Autor: Jodi Picoult
Ano: 2008
Goodreads

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