Leituras #1 – From a Buick 8 (Stephen King)

[Esta Review Contém Spoilers]

Por mais que tente não me consigo lembrar de como deixei o Stephen King entrar na minha vida. Acho que assim de repente percebi que os filmes ‘The Shining’, ‘The Green Mile’ e the ‘Shawshank Redemption’, todos bons filmes à sua maneira, eram baseados em obras de um alguém chamado Stephen King. E pesquisando um pouco sobre o assunto, rapidamente percebi duas coisas:

1) O gajo deita livros cá para fora mais depressa do que a TVI deita novelas;
2) Não há grande consistência na qualidade das suas historias;

Sabem o que dizem em Game of Thrones, sobre cada vez que um Targaryen nasce os deuses lançarem uma moeda ao ar para decidir se ele vai sair louco ou não? Algo parecido acontece com os livros do Stephen King. Quando pegamos em mais um livro dele, nunca sabemos se estamos perante uma grande obra da literatura ou na maior estupidez que vamos ler nos próximos tempos. E sabem o que é que aprendi depois de ler uns quantos livros dele? É que, independentemente do grupo em que o livro se insira, vou passar sempre um bom bocado.

Partindo da minha experiência pessoal e de opiniões de outras pessoas, diria que o facto de alguns livros do SK serem menos apreciados se deve às conclusões dos mesmos, isto é, à maneira como o autor termina as histórias. É construída toda uma ideia e uma história espectacular para no fim sermos deixados com “é só isso?”. Sim, exactamente como quando se perde a virgindade. Spoilando já um bocado a review, diria que “From a Buick8” é um desses livros, com a diferença de que a ideia original sempre me ter parecido estúpida. Agora, carreguem no acelerador e acompanhem-me em mais uma review.

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SINOPSE
In a secret shed behind the barracks of the Pennsylvania State Police, Troop D, there’s a cherry Buick Roadmaster no one has touched in years — because there’s more power under the hood than anyone can handle….
Peço desculpa por ter mantido a ‘sinopse’ na língua original, mas:

1) Não encontrei uma versão portuguesa do livro nos meus 10 segundos de Google research;
2) Não sou formada em nenhum curso de letras para me aventurar nessas coisas de traduções;
3) A editora ou o próprio Stephen King não se esforçaram para escrever sequer uma sinopse interessante, por que raio haveria eu de me preocupar mais.

O que têm de saber é que há um carro nesta história, e um dos bad boys.  É isso mesmo pessoas, o que está no centro do terror desta história é um carro dos anos 50. Deixo aqui uma imagem do criminoso.

Para ser sincera, depois de 30 e tantos livros começa a ser difícil encontrar coisas que se possam tornar assustadoras. Mas também é verdade que uma boa história de terror não deve ser qualificada pelo elemento sobrenatural que a caracteriza, e sim por todo o contexto e ambiente que são construídos ao longo da narrativa. Um Buick Roadmaster como o da figura pode ser bem inocente estacionado num stand, mas o meu coração já palpita um bocado se tiver de andar numa auto-estrada ao lado de um desses, principalmente quando o indivíduo ao volante já conta para cima da idade sensata para conduzir.

Não é facto de o carro não ser particularmente assustador que me incomoda neste livro, mas sim as conclusões e as não explicações com que somos deixados no fim do livro.
Ao longo da maior parte do livro, acompanhamos a história de um carro Buick 8 que chega à polícia da Pensilvânia por volta dos anos 70 e que até ao presente mantém comportamentos estranhos. A história é relatada por um grupo de polícias a pedido de Ned, um puto chato que acabou de perder o pai, também polícia naquela sede, e que à falta de melhor para fazer decide começar a cirandar por ali e fazer perguntas sobre o carro esquisito. A narrativa vai alternando entre o presente, onde um dos polícias fala na primeira pessoa, e o passado, onde passamos a ter um narrador omnisciente. É nesta segunda parte que surge uma característica literária própria do Stephen King que eu gosto imenso, que é a utilização de prolepses para contar a história de um personagem ou até o resultado de algumas acções. Estejam preparados para estar a ler normalmente e de repente terem de lidar com um “Mal sabiam eles que dali a 2 anos o George iria estoirar os próprios miolos”. Love it.

É-nos relatado que ao longo do tempo sempre houve desconfiança, e mais tarde certeza, de que o Buick não pertencia a este mundo. Apresentava características físicas impróprias de um carro, como a auto-regeneração sempre que era riscado ou sujo, a repulsão de partículas do meio ambiente e a capacidade de se mover como um carro normal mesmo não tendo bateria nem qualquer sistema eléctrico visível. Como se já não fosse estranho o suficiente, volta e meia entrava em convulsões sobrenaturais e cuspia raios violetas durante vários minutos, para uns dias mais tarde deixar abortos pelo meio do chão da garagem. Não posso bem descrever o que eram estes abortos uma vez que o livro também não o faz muito bem (“um morcego que não era um morcego” e “um peixe gigante que não era bem um peixe” não me parecem boas caracterizações). Fiquemos com a imagem de coisas repugnantes e distorcidas que pertencem a um universo paralelo. Para quem não estiver a conseguir imaginar, sugiro que se lembrem do Horcrux do Voldemort no último filme do Harry Potter (naquele purgatório esquisito com o Harry e o velho traidor).

É verdade que ao longo do livro é passada repetidamente a mensagem de que “nem sempre podemos ter uma explicação para tudo“, no sentido de explicar ao puto chato que ao longo dos anos as pessoas se foram habituando ao carro e às suas esquisitices e que o interesse em desvendar os seus mistérios foi esmorecendo.  Só não pensava é que essa mensagem fosse para ser interpretada literalmente pelos leitores também. Aqui segue uma lista das coisas que, para mim, ficaram sem resposta e que, definitivamente, mereciam uma:

– Por que é que nunca pensaram em despachar o carro?? No final é verdade que eles explicam que acharam que destruir o carro era má ideia porque podiam eventualmente enfurecê-lo mais e tornar as coisas piores, mas por que é que nunca o despacharam?? A gaita do carro comeu um raio de um polícia e mesmo assim acham boa ideia deixá-lo ali? Não têm de o destruir, mas podem deixá-lo no meio de um descampado ou não?? Deserto do Saara? Gronelândia? Anything? Masoquistas do diabo.

–  Afinal quem era o gajo do início do livro, o Mr. “Oil’s fine”, que começa esta treta toda do carro? Que autoridade é que ele tinha para conduzir o carro? E por que é que ficou incumbido de o trazer para aquele sítio específico? A que mundo é que pertence? Ao nosso, ao do carro, a outro qualquer?? Nunca saberemos.

– O que é que existia de facto do outro lado? Num dos capítulos finais é mais ou menos descrito o que se pode ver através do portal, mas muito minimamente! E por que raio é que depois de todos aqueles anos ainda seria possível ver o chapéu e a pistola do polícia que foi comido? Why? What is the purpose?!

– Qual era afinal o objectivo do carro? Talvez ele não tivesse objectivo próprio e funcionasse apenas como um portal, mas então qual era o objectivo do portal? Comer pessoas e seres vivos, e que mais? Fazer espécies de trocas, “dá cá esse gajo nazi, toma lá este celacanto em decomposição”? Para quê? Porquê?

– Afinal a morte do pai do puto chato foi de algum modo influenciada pelo carro? Acho que tentaram deixar patente que sim, mas de que forma?? Como? Porquê?

– WHY????

São demasiadas perguntas para ficar sem resposta depois de todo um enredo que até estava a puxar pela minha curiosidade e interesse. Deixar pequenos mistérios aqui e ali, é aceitável. Agora isto é como se faltassem mais uns 3 capítulos de exposição e a editora não tivesse alargado o prazo para a entrega da versão final. “Oh fuck it, vai assim mesmo, as pessoas vão comprar de qualquer maneira”. E vão mesmo, Mr. King… Eu pelo menos falo da minha parte, já estou à procura do próximo.

Como sempre, sintam-se à vontade para deixar a vossa opinião na caixa dos comentários ou na votação em baixo. Concordam com alguma coisa, não concordam com nada, há alguma coisa que eu tenha percebido mal? Falem, exponham. Eu estou aqui a ler.

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