A não ficção nunca foi uma parte representativa da minha vida Tentando aqui racionalizar a coisa: penso que, inconscientemente, os manuais escolares e os livros técnicos foram de alguma maneira tomando esse lugar nas minhas leituras. É que até há uns anos atrás, eu era uma leitora mediana (raramente lia mais de três livros num mês) e, por isso, quando arranjava tempo para ler, preferia mergulhar em fantasia e histórias de ficção.
Depois de doze anos de escola e cinco anos de universidade fiquei finalmente livre para olhar para os livros de não-ficção com outros olhos. O que não quer dizer que de repente se tenham tornado uma grande fatia do bolo; estamos muito longe disso. Mas é preciso começar por algum lado e é disso mesmo que venho falar hoje: os poucos livros que tenho andado a ler e que se enquadram na categoria de não ficção!
Este clássico, para além de levar o galardão de primeiro livro de 2021, leva também um prémio aindamais impressionante: o primeiro livro não terminado em muitos, muitos anos. Acho que tal coisa não acontecia desde 2008. Mas, atenção, este best-seller de John Gray não é certamente do pior que já li. Acontece que o autor promete ajudar a resolver, de forma humorística, os problemas mais comuns do casal heterossexual daquela época, o que só por si grita “estereótipos” por todo o lado. Não há nada de mal com isso – era a realidade da altura e, como profissional da área, John Gray terá tido de facto algum fundamento para o que escreveu – mas já não estamos em 1992. Os relacionamentos entretanto tornaram-se mais complexos e diversificados e não acho que este livro tenha tanta (ou alguma) utilidade nos dias que correm. No entanto, é um livro leve, engraçado e que não deverá ofender ninguém.
O ano passado comecei a acompanhar esporadicamente alguns trabalhos da
Joana Marques, nomeadamente a rábula “
Extremamente Desagradável” da Rádio Renascença e a participação no programa “
Irritações” da SIC Radical. Não me tornei uma fã número um mas já deu para perceber que temos um
sentido de humor relativamente parecido e que acabo sempre por me rir bem quando a oiço. Por isso, quando uma
amiga me perguntou se eu queria este livro (
que ela por alguma razão comprou sem grandes intenções de ler), aceitei sem pensar. Depois de o ler, dei graças a Deus por não ter gasto um
cêntimo nele. De novo, não é um livro mau; simplesmente não me
adiciona nada de novo à vida. De forma resumida, “Vai Correr Tudo Mal” é a
resposta da Joana aos livros de
auto ajuda que sofrem o estigma de serem demasiado floreados e sem grande sumo. De forma burlesca, como é seu apanágio, a autora atira-nos as
verdades à cara e acorda-nos dos nossos sonhos utópicos e
irrealistas, sem frases feitas ou exercícios palermas. É um livro
descontraído e e de certa forma original mas que, ironicamente, me acabou por parecer igual aos tais livros de auto-ajuda: relativamente despido de mensagens úteis e com um conteúdo que poderia ter lido num blog qualquer de
life coaching.
Acho que não é vergonha nenhuma admitir que já fui fã da Ana Garcia Martins aka “A Pipoca Mais
Doce” e que foi ela uma das grandes inspirações para eu começar este blog. É verdade que actualmente a influenciadora só quer saber Big Brother e da comédia e que o seu outrora renomado blog agora serve apenas para ocasionais posts patrocinados sobre higiene íntima feminina. Mas tempos houve em que ela era a maior e a melhor blogger de Portugal, com todo o mérito, na minha opinião. Este seu livro homónimo não tem muito que se lhe diga, é apenas uma compilação de alguns dos melhores textos publicados na sua plataforma. O problema é que estamos a falar de um título publicado em 2009, ainda a Pipoca era meio adolescente e as suas visões do mundo ainda eram um bocado infantis e já antiquadas para o momento em que estamos agora. Mas, pelo menos, nessa altura já era divertida e isso torna esta leitura muito mais fácil e muito mais prazerosa.
Mais uma Joana nesta lista, também ela uma radialista e
humorista. Ao contrário da primeira, o meu amor por esta Joana não foi à
primeira vista. Já a tinha ouvido na rádio algumas vezes mas o primeiro
projecto em que a segui mais atentamente foi no
podcast “
Banana Papaia” que apresenta em parceria com a Rita Camarneiro. Nunca cheguei a ver todos os episódios porque, sinceramente, deixei de ter
tolerância para ouvir as
piadas porcas e despropositadas da Joana Gama. Foi preciso começar a ouvir o seu
podcast solo “
Psychoterapia” para finalmente me conseguir conectar com a personalidade dela que é, sim, muito intricada, fragmentada e
fascinante. “Alguém que me Cale” é como que uma
extensão desse
podcast, quase um
fluxo de consciência onde a autora discorre sobre uma variedade de assuntos do quotidiano e da vida de forma surpreendentemente
séria e emocional. Por muito
diferentes que as nossas experiências de crescimento e auto-descoberta tenham sido, identifiquei-me com muitos
pensamentos da Joana e espero
reler este livro um dia destes. O tamanho ajuda na tarefa, lê-se em praticamente em um dia.
O livro lido mais recentemente desta lista, terminado ontem. E este tem daqueles títulos tão explícitos
que nem é preciso eu dizer muita coisa, vocês conseguem à partida decidir se isto vos interessa ou não. Rachel Jeffs foi uma das
53 crianças (!!) geradas por
Warren Jeffs, o até há pouco tempo presidente da
Igreja de Jesus Cristo dos
Santos dos Últimos Dias, uma igreja fundamentalista
Mórmon em que se pratica a
poligamia. No seu livro, Rachel conta a sua história desde que nasceu no seio desse culto, a infância, os abusos sexuais do pai, a adolescência, a maternidade e a vida de casada, até ao presente, depois de já ter fugido. É um relato
revoltante e muitas vezes frustrante. Acho que o mais incrível no meio disto tudo é que não estamos a ler sobre episódios que remontam à
década de 60 ou 70 mas sim de anos bem mais recentes. Em 2014, depois de já se encontrar na prisão há uns bons anos, Warren ainda ditava leis e “
visões de Deus” aos membros da
sua Igreja, influenciando ou mesmo ditando o modo de vida de centenas de pessoas. Confesso que houve capítulos que me
custaram a ler (não por serem gráficos nem nada do género, simplesmente porque não aguento ver gente ser
manipulada à descarada sem poder ou querer reagir), mas saber que a autora conseguiria eventualmente evadir-se ajudou a aliviar um bocado a
tensão.
Não sei como foi a vossa adolescência neste aspecto mas tanto eu como a minha irmã fomos sempre bem educadas no que toca a dúvidas sobre a puberdade e questões do foro feminino no geral. Não só porque a minha mãe era (e é até hoje) enfermeira no bloco de Ginecologia mas também porque sempre tivemos acesso a muitos livros e informação sobre o tema. E como eu adorava ler esses livros! Uma parte menos modesta de mim até regozijava por ser tão sabedora desses assuntos muito antes de os começar a aprender na escola. Em 2020 li “O Livro da Mulher” da doutora e blogger Sofia Serrano e foi quase como retroceder no tempo, excepto que este é um exemplar um pouco mais abrangente e que aborda idades desde a bebé recém-nascida à mulher pós-menopausa. O facto de ser escrito por uma autora nacional traz também a mais-valia de termos acesso a informação mais personalizada, como os planos de vacinação e consultas em Portugal. Um livro que recomendo a mulheres de todas as idades, que me relembrou que há sempre coisas novas a aprender mesmo sobre temáticas que pensamos que já dominamos.
De certeza que muitos de vós já terão ouvido falar sobre este livro depois de tantas recomendações de
grandes
personalidades como o Bill Gates (
e agora eu). Hans Rosling é o criador da organização
Gapminder cuja missão é combater a
ignorância do mundo em relação a matérias como a economia mundial, a poluição e a qualidade de vida. Parece que, afinal, estamos todos
parados no tempo e o nosso planeta caminha todos os dias para se tornar um sítio
melhor do que era há décadas atrás. Claro que com o
progresso e a evolução tecnológica vão surgindo novos
problemas; não pensem que o objectivo de
Factfullness é fazer-vos acreditar que o Planeta Terra está
melhor do que nunca e que podemos ficar
descansados e deixar de nos preocupar com o Apocalipse. Não é. Mas de certeza que nos vai deixar mais aliviados e
optimistas ao perceber que há, de facto, novos factos sobre o mundo que devem ser exacerbados e aplaudidos! E, mais ainda, o autor explica também como devemos peneirar as
notícias que ouvimos e como podemos
interpretar gráficos e números de uma forma mais ponderada e
contextualizada. Façam o teste, visitem o
site oficial da organização e descubram quão
errada é a vossa
percepção do mundo. Depois, leiam o livro e tentem olhar para o presente e o futuro sob uma visão mais
positiva sem, obviamente, ficar a achar que já não há trabalho a fazer.
Agora que ganhei o gosto ao género, é continuar e ver onde é que isto me leva. Já adicionei à lista de desejos outros tantos, dos mais diversos temas. Talvez um dia destes partilhe por aqui.
Desse lado, estejam à vontade para recomendar os vossos livros de não-ficção preferidos. O mais provável é eu ainda não os ter lido.
Fiquem bem 🙂