No que toca a thrillers (não só, mas principalmente) às vezes sinto que devo andar a ler edições diferentes dos demais, tão díspares são as opiniões que resultam de cada lado. E isto aplica-se tanto no espectro positivo como no negativo. Veja-se o caso de livros que a maioria glorifica e que para mim são apenas medianos – “A Criada”, “A Paciente Silenciosa”, “Ao Fechar a Porta” (este último nem mediano é, é só mau) ou, do outro lado, de livros que eu até gostei e que para o resto da malta são meramente banais – “O Apartamento de Paris” e esta nova adição: “Oito Crimes Perfeitos” (Eight Perfect Murders).
A vida não está fácil para Peter Swanson. Não porque não tenha sucesso como escritor ou porque passe fome devido ao pequeno volume de vendas mas porque o seu público saliva há anos pelo livro que replique o sucesso literário que foi o “The Kind Worth Killing“ (“Aqueles que merecem morrer“). Eu ainda não li a bibliografia completa do autor americano mas, e apesar de não ter achado “The Kind Worth Killing” aquela coisa incrível, assumo que essa obra de 2015 seja provavelmente o seu melhor trabalho, do que conheço. E não há qualquer problema com isso, muitos são os artistas que se popularizam por um sucesso e depois passam o resto da carreira sempre na sombra desse grande feito, aqueles a quem os estrangeiros chamam de “one-hit-wonder“, como os Aqua ou o Mark Hamill.
O livro começa literalmente com uma agente do FBI a entrar numa livraria para interrogar informalmente o dono, Malcolm, sobre uma lista que este escreveu há uns anos no seu blog (uma altura em que ainda se liam blogs!), uma publicação onde listava, na sua opinião, os oito crimes perfeitos já inventados na literatura. Acontece que alguém começou a replicar esses mesmos crimes na vida real e Malcolm pode ser a chave para se encontrar o sujeito. A história que se segue vai desvendando quem poderá estar por detrás das mortes, o porquê delas e ainda o porquê de se terem baseado na dita lista. É um enredo que conta com várias reviravoltas, como já se espera, e parece-me que a sinopse é suficiente para aguçar o interesse do leitor comum.
O livro é bem escrito, bem estruturado, as personagens não são em demasia e são características o suficiente para ser distintas. Com umas revelações mais previsíveis do que outras a história avança a um ritmo consistente (na maior parte do livro) e que não dá vontade de largar. Há, no entanto, dois grandes defeitos que tenho de apontar: o final e os spoilers de outros livros de mistério.
A conclusão da obra é bem decepcionante, não só por ser parcialmente conjecturável mas principalmente porque é despachado em dois ou três capítulos e com uma explicação tão pobre que duvido que satisfaça alguém, até o leitor mais tolerante. É como se o Peter Swanson se tivesse esquecido da data de entrega do manuscrito e fosse obrigado a escrever o final numa directa de Sábado para Domingo, qual estudante comum de Engenharia Informática (been there, done that). É, de facto, fraquíssimo e compreendo que possa arruinar o livro inteiro para alguns leitores.
O outro revés da obra é aquele que provavelmente a maioria dos entendidos já terão ouvido ser mencionado, que são os spoilers que a obra faz de oito livros de mistério reais. O facto dos crimes serem baseados nessas histórias leva a que inevitavelmente sejam discutidos pormenores e desfechos que estragam a leitura a quem ainda não as fez (e que esteja interessado). É, de facto, muito desagradável se não estiverem à espera (e para agravar há revelações que surgem meio do nada) e, por isso, quero deixar aqui a lista de títulos mencionados para que possam pelo menos ir preparados de antemão:
- The Red House Mistery (1922) – A.A. Milne
- Malice Aforethought (1931) – Anthony Berkeley Cox
- The A.B.C. Murders (1936) – Agatha Christie
- Double Indemnity (1943) – James M. Cain
- Strangers on a Train (1950) – Patricia Highsmith
- The Drowner (1963) – John D. MacDonald
- Deathtrap (1978) – Ira Levin
- The Secret History (1992) – Donna Tartt
Concluo dizendo que embora eu tenha gostado do tema e do desenvolvimento do mistério do livro (que não considero um thriller) sei que não há-de ficar o preferido de ninguém. Embora comece com uma premissa forte, resvala demasiado no final e as constantes referências literárias ou funcionam ou frustram/aborrecem quem estiver a ler e não tiver ainda muita “bagagem literária”. Mas, mesmo com os seus defeitos, é um livro de que me lembro ocasionalmente e ao qual associo mais memórias positivas do que negativas. É, portanto, uma espécie de favorito meu – um pecadilho, talvez – mas que não recomendo com muita veemência. Há melhor por aí.