“Falsa Testemunha”, um thriller muito morno

Não sou uma pessoa que perca muito tempo a escolher que livros é que vai levar para as férias grandes. Normalmente deixo isso para a véspera da partida e a selecção recai invariavelmente em dois ou três thrillers. Em 2022, correu muito mal (li este e este). Em 2023, a coisa correu melhor (li este e este). Nas últimas férias, a coisa voltou a esmorecer um pouco, e o principal culpado foi o “Falsa Testemunha” da Karin Slaughter.

Leigh é uma advogada que é especialmente requisitada para defender um cliente acusado de crimes de violação e assédio de mulheres. Qual não é o seu espanto quando se depara com Andrew, um então rapaz a quem fez de baby-sitter quando era miúda. E não só Andrew parece estar demasiado crente nas capacidades de Leigh para o ilibar como começa também a insinuar que tem conhecimento de um episódio infame do seu passado que ela estava em crer ser um segredo só dela e da irmã mais nova, Callie. O que é que Andrew sabe de facto? E como é que esse saber pode vir a prejudicar Leigh, a sua filha e a sua debilitada irmã toxicodependente? Ceder à chantagem ou enfrentá-lo e condená-lo são as suas opções, mas as consequências da escolha podem ser irreversíveis.

A primeira coisa sobre a qual gostava de comentar é a lufada de ar fresco que é ler livros onde duas mulheres e irmãs tão diferentes se amam, se respeitam e se protegem. Leigh tem tudo na vida e Callie teria todos os motivos do mundo para a invejar e culpar pelo seu destino sombrio. Ainda assim, isso nunca é assunto e é sem dúvida a melhor parte do livro, esta relação entre as duas irmãs em pólos opostos da existência, o que fizeram uma pela outra e o que continuam a fazer para se salvaguardar.

Em termos de thriller é relativamente fraco. O desenvolvimento é muito lento e só a cerca de metade é que a acção começa a ser desencadeada. Mas mesmo as surpresas que vão aparecendo pelo caminho são muito mais interessantes quando são relacionadas com o plano familiar das protagonistas do que com o historial do Andrew, que em teoria deveria ser o núcleo da história. É muito óbvio o jogo que ele está a tentar fazer e por isso também rapidamente ficamos desinteressados.

Não recomendo se, tal como eu, preferem livros intrigantes e viciantes. “Falsa Testemunha” não é nenhum dos dois. Mas foi tão refrescante ler sobre famílias que se amam e se agarram aos seus laços apesar das diferenças irreconciliáveis e das dificuldades avassaladoras que não consigo dizer que desgostei da obra. E tenho de mencionar também que as descrições dos episódios de adição de opiáceos e de toxicodependência no geral foram das melhores que já li. É verdade que nunca li muitas, por isso, vale o que vale. Em suma, é um livro muito bom se removermos a trama principal e as infinitas referências desnecessárias e cansativas à pandemia da Covid-19. O problema é que tirando isso, não fica assim tanto sumo que justifique a leitura. Está longe de ser um dos melhores livros da autora, certamente, e é um título de que não sentirão falta se passarem ao lado.

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